Greve dos Correios paralisa entregas em 9 estados após impasse por direitos e rombo bilionário

Greve dos Correios paralisa entregas em 9 estados após impasse por direitos e rombo bilionário

Na manhã de 16 de dezembro de 2025, caminhões dos Correios ficaram parados em rodovias de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Não foi um acidente. Foi uma decisão coletiva. Trabalhadores de sete estados — e depois nove — entraram em greve por tempo indeterminado, exigindo o fim da erosão de direitos que, segundo eles, já dura anos. A paralisação afeta diretamente milhões de brasileiros que dependem dos Correios para receber contas, remédios, encomendas de e-commerce e até cartas de familiares. E o pior? A empresa, que deveria ser um pilar da logística nacional, está na berlinda financeira — com um rombo de R$ 6 bilhões só até setembro de 2025.

Os motivos da revolta: direitos que não podem ser negociados

Os sindicatos não pedem luxo. Pedem o básico que já foi conquistado: o adicional de 70% nas férias, o pagamento em dobro nos finais de semana, e um vale-alimentação de R$ 2.500,00, batizado pelos próprios trabalhadores de 'vale-peru'. Sim, é um nome que carrega ironia — como se o valor fosse suficiente para uma ceia de Natal, mas não para manter uma família durante um mês. O Sindicato dos Trabalhadores dos Correios de Minas Gerais foi direto: "A direção dos Correios segue demonstrando total desrespeito: não apresenta proposta econômica, ataca direitos históricos, quer destruir nosso plano de saúde, acabar com os 70% das férias, extinguir a entrega matutina, cortar ticket extra, impor o SD [Sistema de Distritamento] da morte, negar a contratação dos concursados e ignorar completamente as condições de trabalho".

Na prática, isso significa que motoristas e entregadores enfrentam rotas cada vez mais longas, com veículos antigos, sem manutenção, e sem apoio logístico. Muitos relatam jornadas de 12 horas sem pausa para almoço. E ainda assim, a empresa insiste que a greve é "parcial e localizada". Mas quando nove estados — incluindo Mato Grosso e Santa Catarina — aderem simultaneamente, não é coincidência. É sinal de que a insatisfação é nacional.

Correios: 91% trabalhando? A realidade é outra

A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos afirma que 91% dos funcionários continuam trabalhando. Mas quem vê os centros de distribuição em São Paulo e Belo Horizonte sabe que isso é uma metáfora. Em alguns postos, só há um funcionário por turno. Em outros, os caixas estão fechados. O sistema de entrega, que depende de uma cadeia logística interligada, está quebrando nos pontos estratégicos. A Loja Integrada, plataforma de e-commerce, já alertou lojistas: até 70% das entregas no Brasil passam pelos Correios. Sem eles, o Natal das pequenas empresas vira pesadelo.

As medidas contingenciais mencionadas pela empresa? São, na maioria, improvisadas: reforço em centros de São Paulo e Rio, mas sem contratação de temporários qualificados. Ninguém quer trabalhar em um sistema que já está à beira do colapso — e com salários que não acompanham a inflação desde 2022. Os trabalhadores não são os culpados pela crise. São os últimos a serem esquecidos.

A crise financeira: de R$ 20 bi a R$ 12 bi, e o PDV que assusta

A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos não está só em conflito com os funcionários. Está em luta pela sobrevivência. O rombo de R$ 6 bilhões até setembro de 2025 é só a ponta do iceberg. Em 2023, a diretoria já havia sido alertada por auditores internos: "Corremos risco de ficar sem dinheiro". A resposta? Tentar um empréstimo de R$ 20 bilhões com garantia do Tesouro Nacional. Rejeitado. A contraproposta de R$ 12 bilhões ainda está em análise — e vem com condições duras: mais privatização, mais cortes, mais eficiência a qualquer custo.

E aí entra o Plano de Demissão Voluntária (PDV), que pretende retirar 15.000 funcionários até 2027. Nenhum número é casual. É um cálculo: menos gente, menos salário, menos custo. Mas os sindicatos perguntam: e os que sobrarem? E os concursados que esperam há anos para entrar? E os que já estão doentes por causa da pressão? O PDV não é uma solução. É uma desmontagem disfarçada de reestruturação.

O papel do TST e o que vem a seguir

O Tribunal Superior do Trabalho está no meio do fogo. Medeia as negociações, mas não tem poder para impor acordos. A pressão política cresce: prefeitos de grandes cidades já pedem intervenção urgente. O comércio, que depende das entregas, está em pânico. E os consumidores? Estão perdendo pacotes, remédios, boletos. O TST pode obrigar a empresa a voltar à mesa, mas não pode obrigar a direção a ouvir.

Na próxima semana, uma nova rodada de negociações está marcada. Mas até lá, os trabalhadores não vão ceder. E a empresa? Não parece disposta a ceder muito. O que está em jogo não é só um salário. É o futuro de um serviço público que, por mais falho que seja, ainda conecta o Brasil.

Por que isso importa para você

Se você já esperou dias por uma encomenda, ou se seu avô ainda recebe a aposentadoria por correio, você já viveu o impacto dessa crise. Os Correios não são só uma empresa. São um elo social. Um serviço que chega até vilas sem internet, onde o celular não pega. Um serviço que, quando quebra, deixa as pessoas mais vulneráveis. E agora, com a greve, o país inteiro sente o peso da negligência.

Isso não é só uma greve. É o alerta de quem está no chão, vendo o teto desmoronar. E se ninguém fizer nada, em dois anos, o que resta dos Correios será só um nome — e um legado de desigualdade.

Frequently Asked Questions

Como a greve afeta as entregas de e-commerce?

Até 70% das encomendas de e-commerce no Brasil usam os Correios como principal meio de entrega. Com a paralisação em nove estados-chave, lojas pequenas enfrentam atrasos de até 15 dias, perda de vendas e devoluções. Plataformas como Mercado Livre e Amazon já recomendam alternativas, mas os custos sobem até 200% em algumas regiões.

Quais são as reivindicações principais dos trabalhadores?

Eles exigem a manutenção do adicional de 70% nas férias, pagamento em dobro nos finais de semana e o vale-alimentação de R$ 2.500,00 (o "vale-peru"). Também querem o fim do Sistema de Distritamento (SD), que aumenta a carga de trabalho, e a contratação imediata de concursados aprovados há anos. Nenhuma dessas reivindicações é nova — todas foram conquistadas em negociações anteriores e agora estão sendo ameaçadas.

Por que o Tesouro Nacional rejeitou o empréstimo de R$ 20 bi?

O governo considerou a taxa de juros proposta pelos Correios insustentável, especialmente por não haver garantias claras de que o dinheiro seria usado para reestruturar a empresa, e não apenas para cobrir déficits. A contraproposta de R$ 12 bi ainda está em análise, mas exige cortes estruturais, incluindo o PDV de 15 mil funcionários e a redução de rotas em áreas rurais.

A greve pode ser legalizada mesmo com 91% dos funcionários trabalhando?

Sim. A lei trabalhista brasileira não exige adesão majoritária para greve válida — basta que a categoria representada vote democraticamente. A adesão em nove estados, com apoio de sindicatos regionais, é suficiente para caracterizar uma greve nacional. O fato de muitos trabalhadores continuarem operando não invalida o movimento — muitos o fazem por medo de demissão ou por não terem condições de parar.

O que acontece se a greve durar mais de 30 dias?

Se a paralisação ultrapassar 30 dias, o governo pode intervir com a justificativa de "interesse público". Mas isso não significa o fim da greve — apenas que o TST poderá impor uma mediação obrigatória. Historicamente, greves de longa duração nos Correios (como a de 2018) só terminam quando há um acordo concreto, não quando há pressão política. O tempo está a favor dos trabalhadores — o rombo só cresce, e a imagem da empresa se desgasta.

Existe risco de desaparecimento dos Correios como serviço público?

O risco é real. Se o PDV for aprovado e o empréstimo do Tesouro for liberado com condições de privatização parcial, os Correios podem se tornar uma empresa com foco apenas em áreas lucrativas — grandes cidades e e-commerce. As regiões mais pobres e rurais, onde o serviço é essencial, seriam abandonadas. Isso significaria a morte do princípio de universalidade, que é o que diferencia os Correios de empresas privadas de logística.

Comentários (1)


Anelisy Lima

Anelisy Lima

dezembro 18, 2025 AT 23:05

Essa greve é o reflexo de 20 anos de abandono. O governo só aparece quando tem eleição. Enquanto isso, quem paga a conta são os trabalhadores e os moradores de vilas que ainda recebem cartas de parentes falecidos. Ninguém tá pedindo fortuna, só o que já foi acordado.
Se o PDV passar, o próximo a ser cortado vai ser o serviço em áreas rurais. E aí? Vai ser só para quem tem internet e dinheiro?
Isso aqui não é greve. É sobrevivência.

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