Quando João Paulo Magalhães Lins, presidente do Botafogo Associativo chegou a Paris na primeira semana de outubro de 2025, ele carregava duas notícias que mexeriam com o futuro do Alvinegro. John Textor, sócio majoritário da Eagle Football Holdings, já não participava das decisões da holding desde abril, e isso deixava o clube em um impasse. Ainda assim, Magalhães Lins encontrou representantes da Ares Management LLC e conversou com acionistas da Eagle, tudo sem a presença do americano. O Botafogo – que detém exatamente 10% da Sociedade Anônima do Futebol (SAF) – viu a balança mudar num cenário que pode redefinir quem controla o time nas próximas temporadas.
Contexto histórico da SAF do Botafogo
Fundado em 1894, o Botafogo Associativo sempre atuou como clube social e esportivo, mas foi apenas em março de 2022 que passou a ter participação em uma sociedade anônima. Na ocasião, John Textor comprou 90% das ações da SAF através da Eagle Football Holdings, prometendo um investimento de até R$ 500 milhões por temporada. O acordo lhe garantiu controle quase total, enquanto o Botafogo Associativo recebeu 10% das cotas, que foram registradas no endereço da sede social, Rua General Severiano, 171, Rio de Janeiro.
Nos primeiros dois anos, o clube recolheu títulos importantes, como o Super Mundial de Clubes 2025, o que reforçou a narrativa de que a parceria estava rendendo frutos. Porém, já no verão de 2024 surgiram indícios de que a conta bancária do Alvinegro apresentava déficit. A Ares, que havia concedido US$ 800 milhões para a compra do Olympique Lyonnais por Textor em 2022, começou a cobrar garantias mais rígidas.
Reuniões na Europa e sinal de mudança
A virada de chave aconteceu logo após a Cerimônia da Bola de OuroParis. Magalhães Lins representou o Botafogo ao lado de Textor, mas decidiu permanecer na capital francesa para aprofundar diálogos com investidores da Eagle. Lá, ele se encontrou com Jean‑Pierre Conte, acionista americano que detém 3% das ações da Eagle, em um hotel próximo ao Champs‑Élysées.
Nas conversas, foram trazidas duas linhas de ação: a primeira, manter o projeto sob a égide da Eagle, mas com um novo comitê de governança; a segunda, preparar um plano de recompra parcial das ações da SAF, permitindo que o Botafogo Associativo ganhasse maior autonomia. A Ares salientou que, sem garantias financeiras sólidas, a dívida acumulada poderia comprometer o caixa do clube já em 2025.
Posicionamento de John Textor e da Eagle
Em entrevista ao GE no dia 6 de outubro, Textor foi categórico: "Não tem como haver uma reunião da Eagle sem ele estar envolvido". Ele reafirmou seu papel como diretor da holding, embora admitisse que seu envolvimento direto nas decisões se limitasse a consultas estratégicas. No mesmo dia, a Eagle divulgou que o estrangeiro estava focado em outras iniciativas, principalmente no mercado europeu.
A saída de Christopher Mallon da diretoria da Eagle, anunciada em 8 de outubro, fortaleceu a impressão de que a empresa buscava “um novo rosto” para o projeto brasileiro. Fontes internas afirmam que a mudança visa acomodar a pressão dos acionistas sociais do Botafogo, que temem que a continuação da gestão de Textor, “sem garantias de investimento”, possa levar o clube a fechar o orçamento da temporada 2025‑26 com as contas em desequilíbrio.

Impactos financeiros e riscos para a temporada 2025/2026
O Conselho Deliberativo do Botafogo, que teria se reunido em 7 de outubro, adiou a sessão para 14 de outubro, às 19h, na sede do clube no Rio. Entre os conselheiros, a maioria agora avalia duas hipóteses: aceitar um acordo de saída amigável de Textor, permitindo que a Eagle mantenha a maior parte das ações, ou negociar uma compra de 30% a 40% das cotas da SAF, financiada parcialmente pelos recursos que a Ares pode disponibilizar.
Se a primeira opção prevalecer, o clube poderá contar com a expertise internacional da Eagle, mas terá que conviver com um controle acionário dominante que já demonstrou relutância em atender às demandas de caixa locais. A segunda hipótese traz risco de endividamento adicional, porém oferece uma chance real de reequilibrar a governança.
Os números são duros: segundo levantamento interno, a SAF enfrenta um déficit de R$ 120 milhões para fechar 2025, enquanto a Ares propôs um crédito rotativo de US$ 150 milhões, equivalente a cerca de R$ 780 milhões na cotação atual. O Conselho ainda não decidiu se aceita essa linha de crédito, que vem atrelada a cláusulas de desempenho esportivo.
Próximos passos e perspectivas
A reunião do Conselho, marcada para 14 de outubro, deverá definir a estratégia de curto prazo. Enquanto isso, os torcedores já organizam protestos nas ruas de Botafogo, exigindo transparência e “uma gestão que não dependa de dólares estrangeiros”.
Analistas do mercado esportivo, como o economista Paulo Henrique Silva, apontam que a crise pode servir de alerta para outros clubes que adotaram o modelo de SAF: “Quando a tomada de decisão fica concentrada em acionistas externos, o risco de descompasso entre expectativas financeiras e realidade esportiva aumenta exponencialmente”.
Para 2026, o Botafogo planeja reforçar o elenco, mas dependerá da definição de orçamento. Caso a Eagle mantenha o controle, espera‑se um investimento de R$ 200 milhões em contratações. Já se a SAF for parcialmente revertida ao clube social, o limite pode cair para R$ 100 milhões, exigindo foco maior em revelações da base.
Perguntas Frequentes
Como essa crise pode afetar os torcedores do Botafogo?
Se a decisão acabar favorecendo a Eagle, os torcedores podem ver menos investimento em contratações de peso e maior foco em marketing internacional. Por outro lado, uma recompra parcial daria ao clube mais autonomia para priorizar projetos locais, embora possa restringir o orçamento disponível para salários e novas contratações.
Qual o papel da Ares Management nesse impasse?
A Ares foi a financiadora de US$ 800 milhões que permitiu a compra do Olympique Lyonnais por Textor e, hoje, oferece um crédito rotativo de US$ 150 milhões ao Botafogo. Seu interesse é garantir que o clube consiga honrar dívidas e manter a valorização de sua participação na Eagle.
Existe risco de o Botafogo fechar a temporada sem recursos?
Sim. As contas de 2025 indicam um déficit de R$ 120 milhões. Se o Conselho não aprovar novos créditos ou ajustes de governança, o clube pode ser forçado a vender ativos ou reduzir a folha salarial, o que prejudicaria o desempenho em campo.
O que a saída de Christopher Mallon indica?
A saída de Mallon, diretor da Eagle, sinaliza uma reorganização interna da holding. Observadores interpretam isso como um esforço para abrir espaço a novas lideranças que atendam às demandas dos acionistas sociais do Botafogo.
Qual a previsão para a próxima reunião do Conselho?
A sessão está marcada para 14 de outubro, às 19h, na sede do Botafogo no Rio. Espera‑se que os conselheiros deliberem sobre a possível recompra de cotas da SAF e a aprovação de um novo plano de crédito com a Ares.
Comentários (1)
Davi Gomes
outubro 10, 2025 AT 23:01
Mesmo com a turbulência nos bastidores, ainda vejo uma janela de oportunidade para o Botafogo recuperar estabilidade. A estrutura do clube tem talento e a torcida tem energia, o que pode atrair novos investidores que queiram um projeto sólido. Se o Conselho conseguir alinhar a parte financeira com a visão esportiva, o time tem tudo para voltar a brilhar nos próximos anos.